Directora do Instituto
Europeu de Bioética espera que Portugal consiga travar a legalização da
eutanásia.
“Não tenho muito orgulho no meu país nesta
matéria, mas estou aqui para vos contar a experiência de 14 anos da lei que
permite a eutanásia na Bélgica”. Foi assim que Carine Brochier, directora do
Instituto Europeu de Bioética, se apresentou no primeiro debate promovido pela
recém-criada plataforma Pensar & Debater.
A Bélgica foi o segundo
país europeu a legalizar a eutanásia, em 2002, um ano depois da Holanda. Em
2009 foi o Luxemburgo.
A ideia inicial das
autoridades belgas era permitir um uso restrito e acabar com as eutanásias
clandestinas. Em entrevista à Renascença, Carine Brochier diz que a
realidade é diferente.
“Catorze anos depois
vemos que não só continuam a existir eutanásias clandestinas, como também não
se controla o que se passa, por exemplo, nas casas de repouso, nos hospitais e
nas casas dos pacientes que pedem a eutanásia. É tão difícil controlar os
termos da lei, por exemplo o sofrimento insuportável. Como querem controlar
isso, é impossível”, afirma a directora do Instituto Europeu de Bioética.
À audiência presente no
debate realizado na última semana deixou um apelo: transmitam aos políticos
portugueses que esta não é uma situação sustentável.
Questionada sobre o que
fazer, Carine Brochier frisou que é preciso estar informado e preparado para
rebater a argumentação das pessoas que defendem a eutanásia.
“Em nome da minha
autonomia e porque estou a sofrer, peço e tenho o direito de pedir ao meu
médico que me mate? Não é assim. A pessoa é um ser de relações, não estamos
sozinhos numa ilha. Temos uma família e todo um mundo à nossa volta que amamos
e nos ama.”
Para Caroline Roux, da
organização francesa SOS - Fin de Vie, “a morte tornou-se um assunto tabu e nem
as famílias nem as sociedades actuais sabem como a acompanhar”.
Numa altura em que a
questão da morte assistida já entrou no debate nacional, nomeadamente com a
entrega no Parlamento de uma petição que defende a eutanásia, outro
participante francês na conferência da plataforma Pensar & Debater,
Tugdual Derville, da Alliance VITA, deixou o alerta: quando as pessoas resistem
à palavra eutanásia, os seus defensores mudam para “ajuda a morrer”.
“O ano passado, na
Bélgica foram declarados 2.021 casos. Começámos com 232 casos em 2003 e
progressivamente, chegámos a mais de duas mil pessoas que pediram a eutanásia.
Mas ainda muitos outros”, sublinha Carine Brochier que, sem querer arriscar
números, aponta para mais um milhar de casos que os médicos não declararam.
Mas se na Bélgica existe
uma lei que permite a eutanásia porque é que não declaram? Porque receiam estar
fora da lei ou porque não foi o doente que pediu mas sim a família, diz a
directora do Instituto Europeu de Bioética.
Há uma comissão de
controlo, mas este é feito à posteriori. “E como a pessoa já está morta, não
pode reclamar”. Por outro lado, a família não vai fazer um escândalo. “Se é uma
avó de 85 anos e que ainda por cima tem problemas de demência, por exemplo, a
família vai dizer que o melhor que lhe poderia acontecer era morrer. Mas
acredito que o melhor que lhe poderia acontecer era ser acompanhada, por
exemplo, num sistema de cuidados paliativos até à morte. Porque há coisas tão
belas que se podem passar nos últimos momentos de vida”, defende Carine
Brochier.
No dia 26 de Abril
chegou ao Parlamento português uma petição com oito mil assinaturas em que
defende a despenalização da morte assistida. A questão da eutanásia vai entrar
no debate político mais cedo ou mais tarde, mas já entrou na discussão social.
Há muito pouca
informação sobre os cuidados de fim de vida e o acesso aos cuidados paliativos.
Para ajudar a formar opinião, a recentemente criada plataforma Pensar &
Debater escolheu o tema da eutanásia para inaugurar a sua actividade. E
convidou especialistas franceses e belgas para o debate “Eutanásia … uma questão
de vida ou de morte”.
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